segunda-feira, 1 de abril de 2013

Capítulo 3: a culpa, a separação dolorosa e a decepção com o pai

Embora Nino e sua mãe não tivessem onde morar, tinham alguns poucos móveis velhos que restaram da época em que ainda moravam em Bela Aurora. Um fogão vermelho, uma botija de gás, dois colchões de solteiro, uma mesinha com pés de metal e duas ou três cadeiras. Esses bens ficavam guardados nos fundos da casa de uma conhecida de família.

De alguma forma, dona Lana conseguira dinheiro o suficiente para pagar aluguel de uma pequena casa de dois cômodos próximo à casa da família do pequeno Washington. Pegaram seus móveis e entraram na casa. Pronto! Agora tinham onde comer e dormir por um tempo.

Nino estava prestes a completar oito anos. Um dia, na casa de Washington, começaram a brincar. De alguma que ele depois não se lembrava mais, os dois estavam dentro do banheiro. A brincadeira de criança deu lugar a uma viagem de descoberta que, embora os dois não soubessem de que se tratava, possivelmente tinham em mente que aquilo poderia não ser ruim. Sua mãe percebera o que havia acontecido e no caminho para casa, começou a chamar atenção do menino.

- O que vocês estavam fazendo?
Nino não respondeu. Estava com tanta vergonha que a voz não saia.
- Isso não é coisa de gente direita! Quando chegar em casa você vai dobrar os joelhos e pedir perdão à Deus. Tá entendendo?

Ele não sabia que aquilo era tão errado. Na verdade, nem sabia o que era aquilo, mas já sabia o que era o sentimento de culpa.

Certo dia, Nino começara a repetir enquanto andava com sua mãe, palavras que ouviu em uma brincadeira, no entanto, não fazia ideia do que aquilo significava, tanto que repetia de forma errada:
- Impa - pá - impa - pá - impa - pá.
- Que isso, meu filho? - Indagou sua mãe.
- Não sei! Mas ouvi isso e achei legal!
- Hmmm...acho que está na hora de você conhecer seu pai!
- E onde mora meu pai?
- No Rio de Janeiro.
- E o Rio de Janeiro é longe?
- Dá umas oito horas de viagem.
- Hmmmm... - Nino colocou o dedo indicador sobre os lábios tentando imaginar quanto seria oito horas.
- Ah, mãe, você vai comigo?
- Não, meu filho. Você vai com sua avó.

Nas semanas seguintes, Nino perguntava sobre tudo e qualquer coisa sobre o Rio.
- No Rio de Janeiro tem ônibus?
- Tem sim.
- No Rio de Janeiro tem mar?
- Tem sim, meu filho.
- No Rio de Janeiro tem passarinho?
Qualquer coisa que ele via era motivo para saber se também havia no Rio de Janeiro.

Finalmente, o dia da viagem chegara. O embarque era as 22 horas. Uma aflição começara a tomar conta do coração do pequeno Nino, afinal, ele não sabia o que o esperava no Rio, mas o que mais doía era o medo de ficar sem sua mãe. Começou um choro intenso, como se estivesse à caminho da cadeira elétrica.
- Mãe! Eu não quero ir! Por favor! Me deixe ficar com você!
- Quieto menino! - tentava acalmá-lo a avó.
- Não me deixe, mãe! Não me deixe!
- Mamãe vai esperar você aqui, meu filho! - Dizia a mãe com os olhos úmidos.

Nino foi forçado pela avó a embarcar. O ônibus deu partida e o choro aos poucos foi diminuindo.

Chegaram ao Rio e se hospedaram na casa de sua tia. A semana seguinte era a vez de Nino realmente conhecer seu pai. Ele imaginava que seu pai fosse um homem legal, assim como o irmão Antônio, que adorava sua companhia na igreja e a recíproca era verdadeira. Antônio o levava para sua casa de vez em quando e cuidava dele como se fosse um filho. Nino, na verdade, tinha uma ponta de esperança de que sua mãe um dia se tornasse esposa do irmão Antônio e ele tivesse alguém que ele poderia chamar de pai.

Sua avó, iletrada, não sabia o ônibus que a levaria até o homem, mas sabia o nome do bairro. Após algumas direções erradas e ônibus errados, chegaram à noite no Bairro dos Cavaleiros. Subiram uma ladeira e aproximaram-se da casa de seu pai - uma casa simples e mal cuidada para os padrões das casas que a rodeava. Sua avó bateu palmas e foi atendida por uma senhora.
- Oi!
- Oi! Sou eu, Mira! Eduardo está aí? - perguntou a avó.
- Tá não! Ele deve estar no bar logo abaixo.

Voltaram pela rua e na descida da ladeira estava o bar. Dentro dele, vários homens conversavam alto e bebiam. A avó avistou o pai do menino e o convidou a sair para o lado de fora do bar. Um homem de estatura média, sem camisa e com pêlos espalhados por uma barriga volumosa se aproximou. Estava com os olhos vermelhos.
- Esse é seu filho, Eduardo.
- Nossa! Como cresceu!
O hálito de cerveja e outros etílicos era inaceitável para os padrões evangélicos em que o menino vinha crescendo.
O pai passou a mão na cabeça do filho. Conversou alguns assuntos com a avó que para ele não faziam muito sentido. Na verdade, ele nem estava prestando atenção. Esperava que seu pai fosse um homem mais legal. Uma pessoa mais extrovertida. Talvez até um homem bem-sucedido.

O pai entrou no bar e logo retornou com um pacote de biscoito recheado para o menino. Fez algumas perguntas que o pequeno timidamente respondeu.
Despediram-se do pai de Nino e voltaram para a casa da tia.

Na semana seguinte, sua tia, que lhe dera hospedagem, presenteou o filho e Nino com um enorme caminhão de bombeiro de brinquedo para cada. Foi uma felicidade só, que durou dois dias. O brinquedo, que Nino guardara sob a cama de sua tia havia sido despedaçado quando a cama - seja por excesso de peso de sua avó ou por ser um pouco velha, não aguentou e quebrou-se.

Estava chegando a hora de voltar para Vitória e eu não me aguentava de saudades de minha mãe. Quanto ao meu pai...não fez diferença. Ele não passava de um bêbado de porta de bar.

Algumas semanas após ter voltado do Rio, estávamos nos mudando para os fundos da casa dos pais do Washington.

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